LinuxWorld San Francisco 2006

Estou escrevendo offline do avião. Agora são 0h31 (hora de Brasília) do dia 12 de agosto de 2006.

Ontem (dia 11) comecei mais uma das minhas viagens, desta vez para participar da LinuxWorld em San Francisco, California, EUA. Esta é a segunda vez que participo da LinuxWorld naquela cidade. Estive no mesmo evento em 2003, quando estive 40 dias fora do Brasil e participei também de atividades na Costa Rica.

Após a LinuxWorld, irei junto a uns amigos para um evento na sede do Google, em Mountain View, no Silicon Valley. No domingo (dia 20) irei de San Francisco para Detroit, onde ficarei por uma semana na casa de um grande amigo meu, James McQuillan.

Na ida e na volta, passarei alguns dias em Washington DC, a lazer. Afinal, nem só de trabalho vive um homem.

Minha missão na LinuxWorld este ano é de fazer contatos para o próximo Fórum Internacional Software Livre, que acontecerá em Porto Alegre em abril do próximo ano. Como o evento é normalmente patrocinado por empresas multi-nacionais, a LinuxWorld é um bom lugar para fazer esses contatos. Além de captar recursos, tenho também como objetivo trazer novidades importantes para o nosso evento no Brasil.

Além de tratar questões do Fórum, terei algumas reuniões com clientes potenciais para a Propus (empresa onde eu trabalho), dando um primeiro passo nas operações da empresa nos EUA, fruto do consórcio Latinux que foi lançado no último Fórum em Porto Alegre, consórcio esse que a Propus é sócia, assim como outras empresas em vários países das Américas.

Durante a minha estada, vou continuar postando mais relatos sobre as atividades. Espero postar várias fotos também.

A viagem…

Minha viagem começou um pouco conturbada, por duas razões que todos vocês devem estar a par já.

Meu vôo foi adquirido todo em maio e os principais trechos seriam operados pela United Airlines. Como os vôos para os EUA partem de São Paulo ou Rio de Janeiro, o vôo entre em Porto Alegre e o aeroporto de Guarulhos seria operado pela Varig.

Com a crise quase mortal que atingiu aquela empresa, meu vôo partindo de Porto Alegre deixou de existir. Contactei minha agência de viagens para cobrar uma solução da United (a passagem foi paga pra eles), e a United “gentilmente” me conseguiu um vôo às 5h20 da madrugada, chegando em Guarulhos às 6h40. O detalhe é que o meu vôo para os EUA seria às 21h55. Eu teria que esperar 15 horas no aeroporto. Ademais, o tal vôo das 5h20 não era confirmado, então eu corria o grande risco de chegar no meio da madrugada no aeroporto em Porto Alegre e me deparar com um “CANCELADO”.

Solução: pagar mais R$ 300,00 e adquirir um vôo POA-GRU pela Gol, que deixaria Porto Alegre às 15h10, chegando no Cumbica às 17h30, após uma rápida escala no aeroporto Hercílio Luz, na bela ilha de Florianópolis.

Alguns dólares na carteira, tudo ok com o meu visto, passaporte em dia, cartões de crédito ok, cheguei no Salgado Filho pouco depois das 13h, imaginando que poderia haver muita fila, em função dos constantes cancelamentos da Varig e o redirecionamento dos “sem-vôo” para outras companhias. Check-in rápido e eficiente, bem pouca fila e o vôo da Gol precisamente no horário, o que me deixou bem contente. Afinal, eu tinha que chegar em Guarulhos a tempo de embarcar na United.

Com apenas 10 minutos de atraso, o Boeing 737-300 na Gol deixou o portão direto para a cabeceira 11 de Porto Alegre. 40 minutos mais tarde e com um pouco de vento través, o piloto fez um pouso “bonzinho” na pista 32 em Florianópolis. Meia hora de escala e já partimos de novo. Ficamos 15 minutos esperando no taxiamento, porque por incrível que pareça, até hoje o aeroporto Hercílio Luz não tem pista de táxi. O trajeto até o ponto de partida para decolagem é feito pela pista principal. Como havia outro avião na final (chegando pra aterrissar), ficamos esperando-o. Há muito tempo tenho lido que esse problema é motivo de grandes atrasos nesse aeroporto.

17h40 pousamos na pista 10 em Guarulhos. Um pouso meio atrapalhado, diga-se de passagem. Estava um vento chato e inconstante, então não se pode pedir um bom pouso pra ninguém. A vantagem em Guarulhos é que a pista é looonga, então mesmo com vento, um pouso lá não é nada “emocionante”.

Ao retirar minhas duas malas que foram despachadas, encontrei uma avaria. O suporte de uma das rodinhas estava torto. Reclamei pra Gol. Fizeram um formulário de avaria, que me dá o direito de solicitar o reparo quando eu chegar em Porto Alegre. Vamos ver…

Como comentei logo acima, a segunda razão de transtorno foi o desmantelamento de uma quadrilha que estaria promovendo um grande ataque terrorista a aviões de empresas americanas nos próximos dias, em vôos partindo da Inglaterra para os EUA. Não vou entrar em detalhes porque a imprensa só está falando disso desde o dia 10.

Resumindo, os EUA entraram em alerta vermelho e a segurança de todos os vôos para lá foi muito intensificada. Como o plano dos terroristas era de explodir os aviões em pleno vôo usando explosivos líquidos em bagagem de mão, foi proibido carregar qualquer coisa líquida ou cremosa em bagagem de mão. Isso inclui água, refrigerantes, shampoo, pasta de dente e tudo o que você pode imaginar que não seja sólido ou gasoso.

Cheguei no check-in da United às 18h10. O serviço começaria às 18h30, mas a fila já estava bem grande. Todas as companhias emitiram alertas no mundo inteiro pedindo para os passageiros chegar nos aeroportos com no mínimo três horas de antecedência, porque os procedimentos de check-in e embarque iriam ser bem mais demorados. De fato foi.

Antes de chegar no balcão, passei pelo primeiro ponto de inspeção. Os atendentes tinham que fazer algumas questões sobre segurança. Eis parte do nosso diálogo, que achei de certa forma engraçado, embora pertinente:

– Good evening Mr. Dutra… ops, você é brasileiro… posso lhe fazer alguns questionamentos sobre segurança?

– Pois não?

– O senhor está carregando algum artigo líquido, gel ou creme em sua bagagem de mão.

– Sim, meu colírio umidificante. O ar no avião é demais seco.

– Infelizmente seu colírio terá que ser despachado. Algum equipamento eletrônico?

– Sim, um laptop e um palmtop.

– Há quanto tempo você possui esse laptop?

– Quatro meses.

– Você já mandou ele pra assistência técnica ou emprestou ele pra alguém?

– Não. Sempre esteve comigo.

– Alguém deu alguma coisa para o senhor carregar?

– Não.

– Alguém ajudou o senhor a fazer as malas?

– Não. As fiz eu mesmo.

– O senhor não está levando nada que o senhor não tenha pleno conhecimento?

– Não. Estou ciente de tudo o que levo.

O teor do questionamento foi no sentido de que alguém poderia ter escondido algo indevido na minha bagagem. Por exemplo, eu poderia ter emprestado meu laptop para alguém, que poderia ter implantado um dispositivo explosivo sem eu saber. Parece paranóia, mas quando se trata de segurança, é uma briga de gato e rato.

Fiquei sem meu colírio, que certamente iria me fazer falta, mas tudo bem.

É lastimável que interesses políticos e econômicos das classes dominantes causem tanto transtorno às pessoas no mundo inteiro. Infelizmente, pra muita gente hoje em dia, dinheiro e poder vale mais que gente. 🙁 Não estou defendendo ninguém, muito menos os EUA. Eles se fazem de vítimas, mas sabem que boa parcela da culpa dessa bagunça toda é deles mesmo.

Check-in feito, peguei meu cartão de embarque e fui direto pra Receita Federal para declarar a saída temporária de bens. Achei interessante que agora a Receita só exige declaração de câmeras digitais acima de 5,2 mega-píxels. Corretíssimo. Afinal, 99% das pessoas que viajam pra fora do país possuem alguma câmera. Registrar tudo isso seria um caos. Na mesma linha, só estão exigindo declaração de iPods (e similares) acima de 4 GB. Claro que laptop não escapa, então declarei o meu certinho. Não posso correr o risco de chegar no Brasil e ter ele retido.

Cheguei no portão 6 do terminal 1, onde lá já estava o 767-300 que faria nosso vôo. Porém, onde está a tripulação? O pessoal de terra da United estava todo preocupado, porque o piloto (e sua tripulação) sumiu. Minutos depois descobriram que a tripulação tinha ficado presa num congestionamento e que acabara de chegar no aeroporto. Nada que tenha causado qualquer atraso. O embarque foi rápido e bem atendido. 22h deixamos o portão, com 5 minutos de atraso.

Como é de prache nos dois aeroportos de São Paulo, fila para decolar. Mesmo embora o aeroporto de Guarulhos tenha duas pistas paralelas, elas não podem operar simultaneamente, porque a distância exigida para isso é de no mínimo 760 metros entre as pistas, como acontece em Brasília. Então, as duas pistas são usadas alternadamente. As decolagens estavam na 9L e as aterrissagens na 9R. Sobe um, desce um, sobe outro, desce outro… Nós éramos o quarto da fila.

O interessante é que nos EUA a maioria dos aviões permite que os passageiros escutem o diálogo do avião com a torre, inclusive durante todo o vôo, pelo canal 9 do sistema de som. Quem não entende nada de aviação, naturalmente não vai entender nada com nada do que se fala. Como ultimamente eu tenho me metido a pilotar em simulador, aprendi bastante sobre a comunicação de tráfego aéreo.

Minutos depois de deixar o portão, alinhamos na cabeceira 9L e ficamos esperando um pouso terminar na 9R, imediatamente ao lado direito. Logo em seguida, vem a mensagem da torre: “United eight six zero, clearance to take off, runway 9L, wind from zero-five-zero at five knots, good night”. O comandante prontamente confirmou a instrução e os dois motorzões do 767-300 começaram a berrar. Com tanque abastecido para voar 9h45min mais reserva, o avião teve que comer boa parte da pista para alcançar a velocidade de rotação, que deve ter sido algo em torno de 150 nós (278 km/h) em relação ao vento.

Fiquei mais alguns minutos acompanhando a comunicação para ver qual seria a nossa rota. Aproamos para Brasília. Minutos depois da decolagem, nivelamos em 32.000 pés (9753,6 metros), quando foi servido o jantar.

Opção de carne ou frango. Como raramente como carne vermelha, optei por frango. Janta boa, bem quente, mas nada excepcional. Enquanto jantava, estava assistindo no monitor à minha frente o filme “Os sem floresta”. Bem bacaninha, mas esperava mais. Madagascar é muuuito melhor.

Como o 767 é um avião um pouco antigo, os recursos de entretenimento deixam a desejar. As telinhas individuais são meio porcaria, comparadas com as do 777 que já voei, avião bem mais novo, maior e bem mais bonito. Pelo menos este tem mapa de vôo, que eu acho muito importante para saber onde andamos.

Agora são 1h53 e estamos neste exato momento deixando o território brasileiro, na fronteira do Brasil com a Guiana Inglesa e Suriname. Nossa proa agora é a cidade de Georgetown, na Guiana Inglesa. Antes ao interceptar o aeroporto de Brasília, aproamos pra Santarém no Pará, onde houve um leve desvio à esquerda.

Para quem não sabe, os aviões não voam em linha reta, como muitos pensam. Aviões seguem aerovias que são definidas por VORs (equipamentos que emitem ondas de rádio VHF), por isso é comum perceber mudanças de direção durante todo o vôo. É como se o piloto estivesse “dobrando a esquina”. Com o tempo, a aviação está caminhando para a navegação por GPS, mas ainda assim não vão deixar de existir as aerovias.

Continuamos nivelados em 32.000 pés, agora com uma turbulência bem chata. Imagino que em pouco tempo, com o avião bem mais leve (já torramos bastante combustível), vamos ascender para uns 36 ou 38 mil pés, o que possibilita voarmos um pouco mais rápido e gastar bem menos combustível.

Nossa velocidade em relação ao solo agora é de 911 km/h, porque estamos com uns 50 km/h de vento de cauda (nos empurrando). Isso deve fazer a gente chegar quase meia hora mais cedo que o previsto. Viva a natureza! 🙂

A título de curiosidade, a temperatura externa nessa altura é de -32 graus celsius. É mole? Um pouco mais alto deve estar algo como -50C.

Conforme informação do comandante, nosso plano de vôo após Georgetown é aproar para Port of Spain e então para as Ilhas Virgens. Devemos passar à esquerda das Bermudas, onde vamos aproar direto para Washington. Nossa previsão de chegada no aeroporto Dulles (IAD) é 6h20 hora local, 7h20 hora de Brasília.

Segunda-feira pela manhã sigo para San Francisco.

Vou dormir um pouco. Estamos arrecém na metade do caminho. Mais quase 5 horas de vôo até chegar lá.

Boa noite.