Porto Alegre, I’ll miss you

No próximo dia 10, depois de 4.100 dias (11 anos, 2 meses e 20 dias), estarei deixando esta bonita capital, que foi extremamente importante para o meu desenvolvimento pessoal e profissional.

Em julho de 2001, com apenas 20 anos, resolvi deixar o interior (Rio Grande) pra trás e reiniciar minha vida na “cidade grande”. Naquela época, eu já tinha bastante ambição e muita vontade de trabalhar com algo especializado na área de computação. Já fazia alguns anos que eu estudava e me virava muito bem em Linux e infraestrutura de redes, mas no interior e naquela época, era muito utopia querer trabalhar com algo especializado. O único jeito que eu conseguia ganhar dinheiro era instalando Windows, Office, consertando impressora, computador, removendo vírus, etc. Muito deprimente.

Quando consegui uma oferta de emprego para trabalhar apenas com infraestrutura e um pouco de desenvolvimento, não recusei. Me mudar para um grande centro foi uma das melhores decisões que tomei na vida.

Depois de alguns meses morando em cidade grande que fui entender o tremendo abismo que existe no Brasil entre capital e interior. Isso se repete praticamente em todos os estados. Vários anos se passaram e esse abismo continua igual, se não maior. Isso é um pouco triste, porque empurra as pessoas para os grandes centros. 40% da população do Rio Grande do Sul está na Grande Porto Alegre, e naturalmente grande parte desse povo todo veio do interior, como eu fiz.

Quando mudei para Porto Alegre, o meu salário não era ruim, algo como uns 6-7 salários mínimos, mas a burocracia para alugar um apartamento era (e ainda é) algo surreal neste país. Por sugestão de um tio, procurei quartos em algumas pensões e acabei indo parar numa pensão de idosos na Cidade Baixa. Eu era o menos idoso de todos. 🙂 Fiquei lá por 9 meses, até arrumar um amigo que tinha uma vaga para dividir apartamento. Meu amigo Emerson foi meu roommate pelos próximos 7 anos, em 3 apartamentos.

Morei um tempo na Assis Brasil, perto do Bourbon Shopping. Em 2004 mudei para a Rua Mariante (continuação sul da Goethe), no bairro Rio Branco. Em 2007, mudei para um belo apartamento no bairro Petrópolis, onde vivo até hoje. Adoro essa região, pois é bem residencial, calma, silenciosa e com fácil acesso para todo lado.

A maior preocupação da minha família quando mudei para a capital era com a violência. Eu tinha consciência disso, mas esse é o tipo de coisa que só cai a ficha quando a merda bate na sua porta. Em 2006, ao estacionar meu carro na garagem do apartamento da Mariante, sexta-feira, 21h, eu fui sequestrado. Foram as 3 mais longas horas da minha vida, negociando minha liberdade (e minha vida) com dois imbecis, tudo por causa de uns trocados e um carro velho (9 anos de uso e 100 mil km rodados). Mas o maior tapa na cara veio depois, vendo como o Estado lida com isso. Fiquei chocado com o descaso da Polícia Civil com esse tipo de crime. Eu estava tentando ajudar na investigação e ouvi de um delegado que eu devia ir pra casa e não encher o saco deles, pois tinham mais o que fazer. Disseram que só se preocupam com crimes que dão repercussão na imprensa e alguns assassinatos. O resto, salve-se quem puder.

Hoje, 6 anos mais tarde, a coisa está muito pior. Em uma cidade de 1,4 milhão de habitantes, a cada 45 minutos alguém está com uma arma na cabeça por causa um automóvel, como se fosse pecado possuir um. Como eu não percebo nenhum sinal de melhoria nessa barbaridade toda, isso foi um fator decisivo para eu decidir cair fora. Não quero viver a minha vida saindo de casa sem saber se eu vou voltar, porque tem um vagabundo na esquina me esperando. Obviamente, existem N outros tipos de crime, mas o roubo (mão armada) de automóveis chegou num nível inaceitável. O Estado sempre pouco se lixando, pra variar.

Fora o problema de violência, não tenho mais muito o que reclamar. Esta cidade me proporcionou muita coisa boa na vida. Fiz bons amigos, tive a grande oportunidade de conhecer e fazer amizades com gente do mundo inteiro, através do Fórum Internacional de Software Livre, do qual participei da organização por alguns anos. Partindo daqui, viajei o Brasil inteiro, conheci as 3 Américas, África, Ásia e Europa. Aqui conheci minha esposa Luana, noivei, casei e tivemos um lindo filho.

Em 2003, junto com alguns amigos da comunidade de software livre, fundamos a Propus, que começou pequeninha e hoje tem clientes pelo país inteiro, alguns bem grandes, como Petrobrás, por exemplo. É triste se afastar de algo que você ajudou a criar, mas saio tranquilo, pois ao longo desses anos formamos uma equipe brilhante, da qual tenho muito orgulho. Tenho toda certeza que os que ficam vão continuar tocando o barco muito bem.

Assim como foi em 2001, vou recomeçar a minha vida em outro lugar, mas agora o passo é muito mais largo e muito mais sério. Em 2001 era só eu e uma pequena bolsa com roupas. Agora é eu, esposa, bebê e dois cachorros, indo para 10.500 km de distância (linha reta). Outro país, cultura, idioma, tudo diferente.

Para muita gente isso pode parecer assustador. Para nós está sendo uma transição feliz e bastante desejada, mesmo embora estou deixando uma cidade que me proporcionou tanto.

Porto Alegre, muito obrigado por tudo!