Horário de verão tupiniquim, versão técnica

Seguindo o meu último post, quero falar um pouco sobre a importância do relógio, especialmente nos dias de hoje, de um mundo interconectado.

Antes de tudo, que horas são?

O meu relógio está marcando aqui 21h25. É essa a hora certa? Se eu ligar para um amigo agora em Seattle, ele vai me dizer 17h25, em Londres 1h25 da madrugada. Que confusão, eu só quero saber que horas são. Se a resposta foi qualquer hora + 25 minutos, está correta. Tudo depende de onde a resposta está partindo!

Como o mundo inteiro pode se coordenar com essa bagunça de fusos horários, horário de verão cuja regra varia de região pra região, e outras peripécias, como fusos horários de 15 e 30 minutos de separação, etc? Para isso existe o Tempo Universal Coordenado, o UTC, ou GMT (Greenwich Mean Time), ou ainda “Zulu Time”. É importante salientar que a hora UTC nunca varia. Sempre anda para frente na mesma frequência, perfeitamente alinhada com o sol no meridiano zero.

É em função dessa previsibilidade e uniformidade que é a hora utilizada por muitos sistemas no mundo. Toda a aviação no mundo, inclusive aqui no Brasil, por exemplo, só fala UTC. Grande parte dos sistemas na Internet são baseados em UTC. Grandes empresas com sedes em vários países só operam com referências UTC, e assim por diante…

Vários países no mundo possuem horário de verão, por várias razões, principalmente para economizar energia. Não vou entrar no mérito da questão. Os países com governos com algum nível de inteligência possuem regras repetitivas definindo o dia que o horário de verão começa e termina. Não é o caso do Brasil, infelizmente, que nunca teve uma regra, e agora que tem uma, é quase enigmática, baseando-se no calendário lunar. Acredite, não estou brincando!

O que muita gente se confunde é que na verdade não existe horário de verão. O que existe é fuso horário de verão. Um país, ou uma região, quando entra no horário de verão, na verdade está “se mudando” para o fuso horário seguinte. No caso do Brasil, os estados que atendem o horário de verão estão normalmente em UTC-3. No horário de verão, estão em UTC-2. A hora de referência, UTC, é sempre a mesma. Varia apenas o fator de correção em relação ao UTC.

A confusão técnica está em não sabermos quando essa mudança vai acontecer, pois dependia de um canetasso do Presidente.

Considerando que, de acordo com a regra publicada em 2007, parte do Brasil foi para o horário de verão no segundo domingo de outubro e; este ano a regra mudou para o terceiro domingo de outubro, sendo publicada no início de setembro apenas, vamos a alguns exemplos de problemas que isso ocasiona:

Exemplo 1, uma reunião:

No dia 31 de agosto, eu em Porto Alegre marco uma reunião para o dia 14 de outubro às 11h00 da manhã (hora de Porto Alegre) com minha amiga Fernanda que mora em Zurich, portanto 15h00 para ela. Os sistemas de agendamento obviamente vão gravar isso em UTC, para não haver confusão. O sistema consulta o regramento de hora de verão e verifica que no dia 14 de outubro às 11h00 vai ser 13h00 UTC, pois nesse dia Porto Alegre estaria no horário de verão. Reunião marcada. O governo publica a regra dizendo que o horário verão começa dia 19 de outubro. Chega o dia 14 de outubro 11h00 local, 14h00 UTC, 16h00 em Zurich. Ooops, acho que estou uma hora atrasado! Entenderam o drama?

Exemplo 2, aviação:

Este é um exemplo real que aconteceu comigo:

Em agosto em 2006, eu comprei uma passagem da American Airlines para Dallas num voo partindo de São Paulo dia 22 de outubro. Por razões óbvias a aviação opera toda em UTC, e assim são os planos de voo. O plano do voo que eu comprei previa decolagem às 0h30 UTC. Em agosto, os sistemas da American Airlines previam que 22 de outubro seria horário de verão no Brasil, logo aplicaram uma diferença de 2 horas em relação ao UTC, me vendendo um voo que partiria portanto às 22h30 hora local, pois por lei as passagens têm que ser emitidas em hora local, o que faz sentido até. Após eu ter a passagem em mão, o governo no auge de sua estupidez posterga o início do horário de verão para 5 de novembro, pois as ultra-modernas urnas eletrônicas não suportavam isso (claro, com essa bagunça!). Se o plano de voo da American Airlines era para às 0h30 UTC e agora a diferença horária era de 3 horas e não 2, meu voo consequentemente seria às 21h30, correto? A Tam, onde voei de Porto Alegre pra Guarulhos, também registra todos os seus planos de voo em UTC, mas eles usam como referência a hora local, então mantiveram seus voos travados na hora local, ajustando a UTC, o que é razoável para voos domésticos. Resultado, a Tam atrasou todos os seus voos em uma hora em relação ao UTC para manter a hora local e todo mundo perdeu as suas conexões no aeroporto de Guarulhos, causando um prejuízo absurdo para todo o sistema de aviação, que teve que fazer um replanejamento monstruoso de slots e escalas de tripulação e aeronaves para cumprir um canetasso do Presidente.

Como de costume, publiquei o arquivo com a mais nova regra, desta vez mais confusa do que nunca, do nosso horário de verão. Pra simplificar a jogada no Linux, fiz um script que faz a operação toda. Faça o seguinte logado como root:

wget http://hackers.propus.com.br/~marlon/dst/update_dst.sh
bash update_dst.sh

O script vai baixar automaticamente outro arquivo, o southamerica, onde estão as regras que são válidas até 2100, isso se não mudar tudo de novo, é claro.

Para os curiosos, eu fiz um script em Python que calcula o término do horário de verão de acordo com a nova lei para qualquer ano.

Os usuários Windows podem baixar este arquivo de registro e executá-lo em seu computador. Ele vale apenas para 2008. Você deve verificar na sua configuração de relógio se o fuso horário está certo para -03:00 Hora de Brasília e se a opção para ajustar automaticamente para o horário de verão está marcada.

ATENÇÃO: se você quiser mudar para o horário de verão manualmente, jamais mexa no relógio. Altere o fuso horário para -02:00 Fernando de Noronha então. Lembre-se que a sua hora UTC nunca pode mudar.

Boa sorte.

Horário de verão tupiniquim

Todos os anos sempre foi a mesma confusão. O governo brasileiro indo na contra mão de todas as lógicas práticas adotadas por muitos países, a cada ano definiu as datas para o início e fim do polêmico horário de verão semanas antes de seu início, mudando a lógica todos os anos por razões inexplicáveis, causando prejuízos imensos para a economia nos dias de hoje, onde muita coisa é baseada em relógio e esses precisam estar sincronizados corretamente não apenas com a hora presente, mas também com o calendário futuro.

Numa tentativa desastrada de acabar com a confusão de ter uma regra diferente a cada ano, a Presidência da República publica no último dia 8 de setembro o Decreto número 6.558. Quando eu li esse texto, simplesmente não pude acreditar. Se alguém tivesse me contado, eu juraria que era piada. A regra se resume assim:

“Art. 1o: Fica instituída a hora de verão, a partir de zero hora do terceiro domingo do mês de outubro de cada ano, até zero hora do terceiro domingo do mês de fevereiro do ano subsequente, em parte do território nacional, adiantada em sessenta minutos em relação à hora legal.”

Fantástico, finalmente! O governo estaria de parabéns, não fosse a mais estúpida exceção:

“Parágrafo único. No ano em que houver coincidência entre o domingo previsto para o término da hora de verão e o domingo de carnaval, o encerramento da hora de verão dar-se-á no domingo seguinte.”

Muitos devem estar se perguntando “qual o problema?”. À primeira vista, a regra pode parecer simples, mas para quem não sabe, o dia do carnaval é 47 dias antes da páscoa. Como o carnaval é numa terça-feira, o domingo de carnaval acontece 49 dias antes da páscoa. A páscoa, por sua vez, acontece no primeiro domingo após a primeira lua cheia que ocorre depois do equinócio de outono (ou primavera no hemisfério norte), ou seja, se baseia no calendário judaico (lunar) e não no calendário gregoriano. A Pessach (páscoa judaica) acontece sempre no dia 14 do mês judaico de Nissan.

Todos os sistemas operacionais modernos e até mesmo milhares de equipamentos embarcados possuem facilidades para se ditar as regras de entrada e saída do horário de verão, para que isso seja feito automaticamente sem intervenção humana a cada ano. A maneira como essa regra é implementada se baseia estritamente no calendário gregoriano, obviamente. Algo como:

Regra clara na Europa:

  • Início: último domingo de março às 1h00 UTC
  • Fim: último domingo de outubro às 1h00 UTC

Regra clara nos EUA e Canadá:

  • Início: segundo domingo de março às 2h00 hora local
  • Fim: primeiro domingo de novembro às 2h00 hora local

Uma sugestão absolutamente lógica para o Brasil:

  • Início: terceiro domingo de outubro às 0h00 hora local
  • Fim: terceiro domingo de fevereiro às 24h00 hora local

Há um artigo interessante na Wikipédia falando sobre o cálculo da data da páscoa, que por muito tempo foi praticamente um enigma. Vários algoritmos surgiram para solucionar o problema, mas todos bastante complexos.

Uma das coisas mais importantes para a economia e a produtividade em geral é a simplicidade dos processos. Tudo que é complicado naturalmente custa mais e torna tudo menos produtivo. Vide a burocracia, ou burrocracia, tão conhecida de nós brasileiros.

Me entristece ver coisas assim quando o mundo está cheio de bons exemplos simples.

“Existem apenas duas coisas infinitas – o Universo e a estupidez humana. E não tenho tanta certeza quanto ao Universo.”

Albert Einstein

Cusco, dia 2

Dia 16, nosso segundo dia em Cusco, tínhamos a obrigação de acertar a ida à Machu Picchu. O tal agente de turismo ficou de ligar e não ligou. Liguei para o cara e a mesma enrolação, então decidimos desistir e procurar uma alternativa pela Plaza de Armas mesmo. Basta você pôr seus pés na Plaza de Armas para uma multidão de agentes de turismo pular sobre você, oferecendo todos os pacotes turísticos possíveis. Pegamos alguns papeizinhos para ver as opções. Na verdade era tudo igual e fizemos a escolha de forma muito racional, pelo uni-duni-te.

Chegamos na agência do Sr. Fabian, velhinho peruano muito gente boa e super atencioso. Explicamos a situação, que tínhamos os dias contados e tal e analisamos as possibilidades. Ele comentou o que já sabíamos, que o mais complicado era ter o ticket de trem. Tendo isso em mãos, o resto seria barbada. A PeruRail só vende tickets sem intermediários, então tomamos um táxi e fomos para a estação ver o que havia. Conseguimos vaga no trem de partiria de Ollantaytambo (13°15’47.30″S, 72°16’10.49″W) no domingo às 8h30, chegando em Machu Picchu Pueblo (Aguas Calientes – 13° 9’18.53″S, 72°31’27.05″W) antes do meio-dia. Não havia volta no mesmo dia, então conseguimos vaga no trem que partiria de lá segunda-feira às 5h30 na manhã para Ollantaytambo. No início do nosso planejamento da viagem, consideramos a hipótese de dormir em Machu Picchu Pueblo nesse dia, então Tatiana já tinha uma reserva num hotel lá. 🙂 Finalmente resolvemos o principal problema, que era o do trem. Voltamos ao Sr. Fabian com os tickets em mão para acertar o resto dos detalhes.

A grande maioria dos trens para Machu Picchu parte de Ollantaytambo, e não de Cusco. Ollantaytambo está a 2800 metros de altitude e Cusco a 3400 metros. Essa descida é muito lenta de trem, então há poucas frequências por dia. O melhor é ir de carro até Ollantaytambo, que é onde termina a estrada. Daí em diante, não existe outra alternativa que não trem. Como o caminho é mais plano até Machu Picchu Pueblo (2400 metros), há mais frequências diárias nesse trecho.

Montamos o seguinte pacote então com o Sr. Fabian: ida de táxi de Cusco a Ollantaytambo, ticket do ônibus para subir e descer de Machu Picchu, guia turístico em Machu Picchu, volta de táxi na segunda-feira de Ollantaytambo a Cusco fazendo todo o Vale Sagrado dos Incas de forma reversa. O motorista do táxi seria um guia turístico habilitado. O pacotão todo saiu uns US$ 310,00 pra nós dois, já com as taxas de entrada a Machu Picchu, que é US$ 45,00 por cabeça. Facada! O trem ida-e-volta pra nós dois ficou US$ 182,00, super facada também!! Com isso tudo resolvido, ficamos bem mais aliviados. Seria o fim da picada ir ao Peru, ir a Cusco e não ir a Machu Picchu por causa de um detalhe. Mesmo sabendo que vou voltar lá outras vezes, não queria perder esta oportunidade.

Como tínhamos praticamente todo o sábado livre, compramos um city tour de ônibus para conhecer mais a região ao redor de Cusco. Se você for a Cusco, não menospreze um city tour. É super barato, como US$ 15,00, e vale muito a pena. Infelizmente, muita gente acha que o Peru, especialmente a região de Cusco, é só Machu Picchu. Tem muito mais coisas fantásticas pra conhecer. No final dos relatos, eu falo melhor sobre isso e a minha opinião.

A primeira parada do tour foi no Qorikancha – Templo do Sol (13°31’12.69″S, 71°58’32.42″W), que na época Inca foi o templo mais importante da cidade de Cusco. Depois da chegada dos Espanhóis, eles construíram o Convento de Santo Domingo sobre o templo. Legal o lugar, mas nada demais.

O destino seguinte foi Saqsaywaman (13°30’27.84″S, 71°59’0.01″W), que foi uma fortaleza cerimonial dos Incas, construída no século XV. O lugar é todo feito tradicionalmente com pedra sobre pedra, sem nenhum tipo de rejunte. É assustador a perfeição do encaixe das pedras, ao ponto de não entrar uma simples agulha entre elas. A técnica de corte e polimento das pedras pelos Incas é impressionante. Clique na foto ao lado o observe bem os encaixes e o tamanho delas, sempre levando em consideração que isso foi feito há mais de 500 anos. Os guindastes foram criados bem depois disso. Há um artigo na Wikipedia bem interessante sobre o lugar.

Na sequência, fomos ao Q’enqo (13°30’31.70″S, 71°58’14.30″W), que foi um anfiteatro Inca, também usado para armazenar a Chicha, que é uma famosa bebida fermentada feita de milho, muito boa, muito servida até os dias de hoje.

Seguimos então até Tambomachay (13°28’51.27″S, 71°57’52.71″W), que é um sítio arqueológico que foi destinado ao culto da água, onde os Incas tomavam seus banhos sagrados em fontes de água que descem dos picos nevados. O mais interessante é que as fontes estão funcionando perfeitamente até hoje. O complexo é feito de vários canais de água. Há um certo canal sagrado que se divide em outros dois secundários, os quais jorram precisamente o mesmo fluxo de água. Coloque um copo em cada e eles vão se encher exatamente ao mesmo tempo. Tambomachay foi o ponto mais alto de toda a nossa viagem ao Peru, onde atingimos 3800 metros acima do nível do mar.

Na volta ao centro de Cusco, paramos para ver uma vista bonita logo após o pôr do sol. Eu estava observando as montanhas ao redor, quando milagrosamente, olha quem vinha por trás delas, a Lua Cheia. De arrepiar!! Algumas pessoas não acreditaram no que estavam vendo. Seguramente uma das visões mais lindas que eu já vi na minha vida. São coisas que só a natureza pode proporcionar.

Chegamos no hotel bastante cansados, jantamos e dormimos cedo. 5h30 da manhã de domingo o taxista passaria no hotel para nos apanhar e seguir até Ollantaytambo, assunto do próximo post.

Saludos!

Por Cusco

Emendando o último post, dia 15 acordamos cedo e fomos para o aeroporto. Nos recomendaram chegar sempre 2 horas antes do voo, mesmo que seja doméstico, porque as filas nos aeroportos peruanos são sempre grandes. Nosso voo era próximo das 8h30, então deixamos o hotel pouco antes das 6h. Perguntamos na recepção do hotel se chamariam um táxi para nós. Como eu já esperava, a resposta foi ir até a esquina que logo passaria um, mesmo sendo 5h45 da madrugada. De fato, não esperamos nem 5 minutos.

Como chegamos bem cedo no aeroporto Jorge Chávez, praticamente não havia fila no check in da Star Peru, companhia aérea peruana que nos levaria até e Cusco. Os voos pela Star Peru normalmente são bem mais em conta que nas tradicionais Lan e Taca. Em contrapartida, eles operam aeronaves bem mais velhas. Nosso voo foi num Boeing 737-200, antigo mas bem cuidado. Embarque e decolagem no horário, tudo bastante rápido e prático.

Lima, pra variar, sempre cinza. Decolamos da pista 15 e mantivemos a proa da pista (sudeste) por vários minutos, até livrar uma altitude segura pra sobrevoar as cordilheiras. Em seguida que dobramos pra interceptar nossa aerovia pra Cusco, já impressiona a altitude das montanhas e vários picos nevados. Voamos a 35.000 pés, sempre com uma vista estonteante.

O aeroporto de Cusco é um dos mais altos do mundo, a 10.860 pés (3.310 metros) de altitude. Nessa altura, o ar é extremamente rarefeito, então qualquer manobra voando deve ser feita com muito cuidado e geralmente muita velocidade. Antes de decolarmos em Lima, consultei as cartas aéreas de Cusco para ver como seria a aproximação. Embora Cusco esteja a 3400 metros em média, a cidade é um “buraco”, pois está cercada de morros na casa dos 4500 metros. Em função disso, não existe aproximação por instrumentos (ILS), pois é impossível projetar uma longa final em nenhuma das cabeceiras da pista. Sempre vai haver um grande morro a frente. A pista em cusco é a 10-28 (leste-oeste) e só há operações de um lado. Todos os pousos são na 28 e todas as decolagens são na 10, não interessa o vento. É assim pois a única forma de aproximar, e afastar, é a leste-sudeste do aeroporto, onde há um pequeno vale que se pode voar “baixo”. Esse vale não está exatamente na reta da pista. O procedimento de aproximação obviamente é visual. Sobrevoamos o setor sul do aeroporto, circulamos no tal vale, no setor leste, e viemos pra pouso. O alinhamento final é feito próximo à cabeceira, pois há um morro enorme atrás dela. Detalhe: toda essa manobra foi feita mantendo 450-500 km/h. Full flaps só na final, e tocamos na pista a 310 km/h, medidos pelo GPS (ground speed). Muito sinistro. Definitivamente não é qualquer piloto que opera por aqui, ainda mais com um jato.

Chegando em Cusco, e até mesmo já no avião, percebemos a invasão turística do local. A quantidade de japoneses no voo era algo. O aeroporto de Cusco é pequeno, mas é bem arrumadinho. Esperamos poucos minutos para ter nossas malas. Nos dirigimos a uma cabine de táxis e negociamos o táxi até o hotel. Lembre-se que não existe taxímetro por aqui. 6 soles (algo como R$ 3,00) até o hotel, e não era perto. O motorista era muito gente boa, e como era de se esperar, um peruano muito nacionalista (todos são). Brasileiro é muito bem-vindo em qualquer lugar, e ele naturalmente ficou feliz de saber de onde éramos. Nos dirigiu até o hotel falando muito sobre o que podíamos fazer pela região. Enfim, toda a região de Cusco vive praticamente do turismo, e eles se esforçam para tratá-los bem.

Cusco é uma cidade bastante pobre. Seus 350 mil habitantes vivem direta ou indiretamente do turismo. Muita gente vive do artesanato. A quantidade de gente vendendo de tudo nas ruas é impressionante. As pessoas abordam bastante, inclusive crianças pequenas vendendo de tudo. Algumas até imploram para que você compre algo. Chega a dar pena.

A primeira coisa que se percebe ao chegar em Cusco obviamente é a altitude, especialmente para quem não está acostumado. Desde que eu nasci, vivo ao nível do mar, e qualquer coisa acima de 700 metros é considerado serra no Brasil, ou seja, ninguém no Brasil sabe o que é mal de altitude. Na Costa Rica, eu já havia estado por uns momentos a 2800 metros, e senti bastante cansaço ao caminhar. Aqui é tudo ao redor de 3400 metros. Você percebe rapidamente que a sua frequência respiratória e cardíaca aumentam, especialmente ao fazer qualquer esforço, como subir uma escada. Ao chegar no hotel, na verdade uma hospedaria, tinha que subir um lance de escadas. Nunca senti a minha mala tão pesada. Parecia que tinham enchido ela de pedras. Bastou um vão de escada para me deixar com falta de ar e o coração tum-tum-tum-tum. Sempre que os locais recebem um visitante em Cusco, é tradição oferecer antes de tudo um chá de coca, que é um santo remédio para altitude. Todos os hotéis fazem a mesma oferta. Obviamente não dispensamos. 🙂

Nos hospedamos na “Hospedaje Monte Horeb”, que fica na rua Juan de Dios (13°31’1.24″S 71°58’53.14″W). Tudo bem arrumadinho, quarto privativo, água quente e Internet wireless. O melhor era a localização, a 200 metros de Plaza de Armas, centrão de Cusco. Hospedagem em Cusco é relativamente tranquilo, pois há milhares de opções, desde hotéis mais tradicionais, e mais caros, até albergues da juventude, bastante baratos. Embora essa região seja uma das mais visitadas do mundo, não existe uma exploração turística muito absurda em termos de preços, pois a maioria dos hotéis e restaurantes é de gente local. Também porque a quantidade de mochileiros é enorme, e essa galera geralmente viaja com grana curta. Pelo jeito, os turistas curtem muito essa coisa de tudo ser regional. Eu, particularmente, acho excelente. Por incrível que pareça, não vi nenhum McDonalds em Cusco. Em Lima, há por todo canto, assim como Starbucks e outras grandes cadeias multi-nacionais.

Nossa estadia em Cusco seria até o dia 20, quarta-feira, para dar tempo de ir a Machu Picchu e conhecer algo do vale sagrado dos Incas. O grande problema é que não tínhamos nada certo para isso. Tentamos comprar os tickets de trem para Machu Picchu via Internet, mas a concessionária da linha de trem, a PeruRail, só aceita cartões Visa que participam do programa Verified by Visa, algo raro no Brasil. O pior de tudo era que quase não havia mais vagas no trens, então tínhamos que correr para conseguir algo por Cusco mesmo. Nosso amigo Daniel nos passou o contato de um agente de viagens de Cusco que podia fazer a mão toda. Chegamos no hotel, arrumamos as coisas e fomos para rua, para conhecer algo do centro e ir até o tal agente.

Chegando na Plaza de Armas, havia uma festinha popular, com um bloco de gente fantasiada e músicos. Não sei exatamente o que estavam celebrando, mas estava bastante divertido e rendeu algumas fotos interessantes. Como carregavam a imagem de uma santa, suponho que fosse algo religioso. A Plaza de Armas é o ponto mais central de Cusco, onde “todo mundo se encontra”. Há algumas igrejas coloniais ao redor, várias agências de viagens, restaurantes, algumas hospedarias e muita gente vendendo de tudo. É um lugar bastante agradável de sentar e ficar observando o movimento de centenas de turistas, e muitos locais, pra todo lado.

Tínhamos o endereço da nossa agência de viagens, mas nenhum mapa nosso mostrava a tal rua. Pedimos informação e chegamos à conclusão de que o tal endereço estava além do mapa, logo era um pouco longe, mas dava pra ir caminhando. Fomos caminhando pela Av. El Sol (foto ao lado), que é uma das principais da cidade, concentrando repartições públicas, bancos, correios, etc. Depois de uma meia hora caminhando e pedindo informação, chegamos no tal lugar. Falamos com o tal agente, que nos deu algumas opções, mas não tinha certeza de nada. Resulta que nada se resolveu e ele ficou de nos ligar antes das 17h00. Como já era meio-dia, decidimos almoçar ali por perto mesmo. Almoço: cebiche e pescado, claro. 🙂

Depois do almoço, voltamos tudo pela Av. El Sol, só que agora subindo a avenida. Era uma inclinação pequena, mas me sentia como subindo uma montanha. Como o clima é estupidamente seco nas alturas, o sol frita. A temperatura ao dia estava na casa dos 23 graus. Se você fica na sombra, sente frio, no sol, torra. O negócio mesmo é andar sob o sol, sempre usar um boné ou chapéu e óculos escuros, e claro, SEMPRE protetor solar. No caminho, passamos um centro de artesanato bem legal, onde as coisas eram normalmente mais baratas que com os ambulantes. Como à noite a temperatura é sempre próxima de zero graus, já comprei uma gorra de lã. Ia comprar uma manta também, mas nenhuma me agradou muito. A Tati comprou um casado de lã de alpaca bem legal. Isso no Brasil custaria uma fortuna. A lã é muito boa.

Embora um desafio físico nos primeiros dias, já no primeiro dia simpatizei demais com Cusco. É super agradável caminhar pela cidade. Como pode ser visto nas fotos, as construções são bem antigas e a cidade vive muito esse clima. Eu poderia citar Gramado e Paraty como cidades com um ar semelhante. O trânsito não chega a ser o caos total que é em Lima, mas o povo é o mesmo, e consequentemente, muito chegado numa buzina.

Como no primeiro dia não podíamos fazer muito esforço, ficamos caminhando sem rumo, conhecendo algumas coisas na volta e tomando fotos. Paramos numa praça para tomar café, e lá vinha outra bandinha de rua e uma festinha popular (foto ao lado). Pelo jeito, chegamos num dia animado na cidade.

Veja também: galeria de fotos de Cusco.

To be continued…

Dias seguintes em Lima

Na quarta-feira, dia 13, só tínhamos compromisso à tarde, que seria a última palestra de Tatiana no CONEIS. Como tínhamos a manhã livre, almoçamos e passeamos um pouco por Miraflores, região onde estávamos hospedados.

Até esse dia, não tínhamos nada de moeda local ainda, pois o evento estava cobrindo todas as nossas despesas de alimentação. A facilidade de trocar dólares ou euros no Peru é incrível. Há inclusive gente ambulante na rua fazendo câmbio. O dólar circula oficialmente na economia. É possível inclusive sacar dólares em qualquer caixa automático.

Almoçamos pela Av. José Larco, que é uma avenida onde ficam vários comércios de Miraflores. No início dessa avenida, junto ao Oceano Pacífico, fica um centro comercial chamado Larcomar, que é bastante interessante. Embora Lima seja uma cidade na beira do mar, boa parte dela está em torno de uns 100 metros de altitude. Essa camada de rochas vai até o oceano praticamente. O Larcomar foi construído justamente nessa encosta. Você entra pelo andar mais alto e vai descendo. Há vários restaurantes, lojas, museus, cinemas, etc. A vista é fantástica. No álbum de Lima há algumas fotos tomadas aí. Uma pena que Lima nesta época está sempre cinza. A umidade é muito alta, pois as nuvens estão mais baixas que as cordilheiras e ficam trancados sobre Lima.

Às 16h30 foi a palestra da Tatiana sobre o InVesalius. O pessoal ficou bastante interessado com a solução, e também bastante curioso com os modelos de prototipagem rápida apresentados, como pode ser visto nas fotos do evento.

Nossa participação no evento terminou nesse dia. Nos agradeceram a participação formalmente e nos presentearam com um bonito troféu de vidro.

Na noite da quarta-feira fomos com Daniel até a Asociación Cultural Brisas del Titicaca, que é um clube bastante tradicional de Lima, onde se pode ver várias danças típicas. Vimos vários tipos de danças provenientes de diversas regiões do Peru. A dança mais típica do país é a Marinera, que pode ser vista no vídeo a seguir:

Fiquei impressionado com a habilidade do garoto. Depois daí, nos despedimos de Daniel, que viajou para Tacna, sua região natal, no dia seguinte.

A quinta-feira, dia 14, foi um dia todo livre em Lima. Fomos visitar o sítio arqueológico Huaca Pucllana, que fica em Miraflores, a uns 15 minutos de nosso hotel, caminhando. Coordenadas: 12° 6’40.70″S 77° 1’59.60″W. Huaca Pucllana é um sítio da Cultura Lima, que viveu entre os anos 200 e 700 depois de cristo, bem antes dos Incas. Parte do que eles construíram foi preservado nesse complexo. Os Limas foram uma das várias sociedades que existiram no Peru. Clique na foto ao lado para ver o álbum que fizemos aí.

Tatiana perguntou aí que outros lugares seriam interessantes de a gente conhecer em Lima. Nos recomendaram o Parque de la Reserva, que teria um espetáculo interessante de águas. Pegamos um táxi com um senhor muito simpático depois de perguntar se ele sabia onde ficava o tal lugar e negociar o preço. Ele nos comentou que o tal parque era bastante e bonito e tal. Não sei o que se passou pela cabeça do velho, mas ele nos deixou em outro parque, o Parque de La Exposición (12° 3’44.70″S 77° 2’10.08″W). Como a gente não sabia, saímos caminhando por aí e não achamos nada de interessante com água. Alguns minutos depois, perguntamos a um policial, que nos disse que estávamos no lugar errado. A sorte que o outro parque era perto, então fomos caminhando.

Entre um parque e outro, fica o Estádio Nacional (12° 4’2.39″S 77° 2’1.26″W), que é geralmente onde acontece os jogos da seleção peruana. Tentamos entrar para ver o campo, mas todos os portões estavam fechados.

Finalmente conseguimos chegar no Parque de La Reserva (12° 4’15.31″S 77° 1’58.54″W), onde fica o Circuito Mágico del Agua. O local foi construído há um ano e possui uma infinidade de jatos de água ornamentais. Pra quem curte água, vale a pena visitar. O negócio é muito bonito, especialmente à noite, quando eles misturam tudo isso com iluminação colorida, inclusive com efeitos de raios laser, tudo ao som de música clássica de fundo. É também um belo lugar para um bom desafio fotográfico. Fotografar água é super interessante, pois dependendo da velocidade do obturador, você extrai fotos completamente diferentes. Como você pode ver nas fotos que eu tomei, a maioria foi feita com velocidade baixa, em torno de 1/10s, para realçar o movimento da água. Na correria de viajar, esqueci o tri-pé da câmera em casa. Com ele, teria feito fotos espetaculares. 🙁

Saímos do parque à noite e fomos jantar na famosa Calle de Las Pizzas, em Miraflores, onde várias pizzarias e outros restaurantes ficam lado a lado disputando os clientes, na sua grande maioria turistas, como nós.

Na sexta-feira, dia 15, voamos para Cusco, assunto do próximo post.

Abraços.